
Hoje, fazemos aniversário. Contradições do amor. Parece-me ter sido ontem, todavia sinto ser um ano cada um desses 365 dias. A única coisa capaz de dialogar com o tempo é o amor: ele nos torna sábios anciãos e pueris crianças. A felicidade está em conseguir equilibrar esses dois reflexos do tempo dentro de nós. E, se não conseguimos, para não sermos intitulados impotentes, tentamos classificá-lo. Usamos calendários, denominações frias, relógios...destes, um só não basta. É necessário o termos ao alcance dos nossos olhos a todo instante. Dumont deu asas aos homens, mas tornou-os ainda mais escravos do tempo, cravando neles um sinal no pulso. Lá mesmo! Onde é possível sentir clamar a vida.
Pelo meu amado, esperei anos, decádas, milênios. Vi passar os segundos preguiçosamente, enquanto tecia os sonhos ao sol e os desfazia à lua. Como Penélope, esperei por ter certeza. Desconhecia que nada na vida é certo, exceto o fim. Freud escreveu à sua amada indagando-a: "Não se sente meio orgulhosa por ser capaz de fazer feliz alguém que está tão distante?" Talvez o verdadeiro amor seja constituído de ausências.
Hoje, no dia de nossos anos, escrevo enquanto me vejo esvair-se de mim languidamente.Morro para ele, como outrora morri para mim quando a lança de seus olhos atingiram-me no peito fatalmente. Morro como morri com seus risos e com seu pranto. Morro como morri ao vê-lo soltar das minhas as suas mãos e como nas vezes em que se perdeu de mim sem que eu soubesse.
Morro, por fim, quando partiu e me partiu. Despeço-me dele sem lágrimas nos lábios ou riso nos olhos. Despeço-me plácida e lividamente.E peço, como pedido derradeiro da vida que a ele entreguei que, se me estiver ouvindo, não regresses mais. A dor devorou todos os nossos sonhos e eu não suportaria viver para perder-te uma vez mais.Deixe que, do mesmo modo como o destino desenlaçou nossas mãos, ele dilacere os sonhos que dormimos, o tempo que vivemos e o amor que encontramos. Deixe que o destino escarneça a alma que ainda me resta presa a essa saudade constante que me surge como um grão de esperança. Se me ouves, abandone-me! Deixe-me morrer afogada na dor da solidão.
Disse Machado que a grande vantagem da morte é "que, se né "que, se não deixa boca para rir, também não deixa olhos para chorar..." Acredite-me. De meus olhos, nenhuma outra lágrima de saudade será desperdiçada em teu nome.